Minhas ideias "anti capitalistas" recentes
Tenho pensado muito sobre isso ultimamente. Pensei em fazer um texto corrido, mas acho que meus devaneios são tão esparsos que vale a pena só jogar uma coleção de bullet points aqui.
Eu concordo que o caplismo é insustentável.
Esse crescimento desenfreado vai consumir o planeta.
É amoral e prejudicial para saúde mental das pessoas.
É explorativo e cultiva desigualdade social cada vez maior (Eu sei que qualidade de vide absoluta da base aumenta, em muitos casos, mas não é suficiente, e é em países "exploradores").
Mas eu queria levatar umas coisas importantes para os movimentos anti-capitalistas (ou pelo menos o que eu, Lucas Severo, quero participar em anti-capitalismo [ou menos-capitalismo lol]):
[importante]: O capitalismo não vai acabar. É a primeira premissa que todo "anti-capitalista" pragmático e realista tem que ter como uma máxima. Pra mim essa é a ideia mais importante. Volte pra essa frase sempre que se esquecer disso.
O capitalismo "funciona" pois combina muito bem com a mentalidade média humana. Não há outro sistema que combine tão bem. Isso não sou eu defendendo o capitalismo. É o que é.
O capitalismo tem muitos mecanismos para escalar, e retroalimentar seu crescimento. Não tem como botar algo novo pra competir, sendo que quase tudo que é anti-capitalista é contra competição, por exemplo.
Ser urgente, ou falar que a gente já tá atrasado para medidas, por exemplo, ambientais, não necessariamente ajuda a propagar uma informação, se esse discurso te faz soar alarmista (por mais que seja verdade). Se teu discurso não convence pessoas, ele não serve pra muita coisa.
Levando em conta que o capitalismo está aqui pra ficar, o que dá pra fazer pra gerar impacto positivo, é trabalhar em cima do capitalismo para gerar, de pouco em pouco, impactos positivos.
Não dá pra demonizar todo mundo que cresce no capitalismo, e não faz sentido criticar toda "incoerencia" de pessoas que crecem e tem perfil filantrópico. É melhor pessoas filantrópicas crecendo do que pessoas não filantrópicas. É tiro no pé.
Não dá pra julgar todo mundo que ainda "faz muito parte do sistema". Pessoas que trabalham pra big tech ou só continuam dormentes em suas realidades consumistas. E só criticar não vai gerar conscientização.
E o que eu acho que está acontecendo, e deve continuar acontecendo é:
A gente tem que criar mais coisas anti-capitalistas que conseguem coexistir com capitalismo.
A gente tem que, "infelizmente" (por estar alimentando ainda um sistema desigual), se aproveitar do capitalismo e usar a sua engrenagem desbalanceada de valor para ajudar pessoas em posição de vulnerabilidade. Empregar pessoas de grupos subrepresentados, por exemplo, em empregos que paguem bem (e que talvez vão trabalhar pra empresas com indole questionáveis, mas a alternativa é pior).
A gente tem que também criar coisas que são puramente livres de capitalismo, quanto mais disso melhor. Comunas, collectives, eco-vilas, ONGs, Cooperativas*. Várias não vão vingar. Várias vão. Isso não vai ser contagiante o suficiente para espalhar como algo global (volta pro ponto importante la de cima), mas é importante que existam, e tenha gente fazendo. Galera muito descrente vai olhar pra isso e pensar em esforço desnecessário, mas foda-se. É importante pra jogar o pendulo um pouco pro lado contrário do capitalismo.
Coisas que visam lucro ainda alimentam o sistema, e sistemicamente afetam negativamente o planeta nessa vibe de crescimento desenfreado. Mas se elas tem um pouco de impacto positivo, é melhor não demonizar, pois a alternativa é pior.
Existem empresas que estão tentando freiar ou até desacelerar seu crescimento, fazendo degrouwth. Estão gerando lucro, e são operacionais, mas ainda tem o objetivo claro de não escalar, e na verdade desescalar. Mais coisas como essas também vão ser necessárias. "Vender" isso como algo não só de impacto positivo, mas também como algo benéfico pra quem está envolvido é importante (saúde mental, work-life balance, family time, etc).
Dito isso, passando por coisas que são claramente anti-capitalistas, é importante aceitar que elas não vão ser o que se faz no geral. Elas não serem escaláveis, contagiantes, propagantes é algo que é intriscecamente parte delas. Isso não vai aglutinar o capitalismo. Quem vai se envolver nisso já são pessoas inclinadas a se envolver nisso. Isso é "ok", pois é o que tem pra hoje (não é ok pras pessoas que sofrem muito com a urgência dos problemas que a gente tem no mundo, mas não sei o que falar pra ti...).
Claro que estou olhando pra isso do ponto de vista das pessoas, e não dos governos. I can't even...
O lado dicotomico de autruísmo próximo e egoísmo global que o capitalismo entrega.
Eu quero ajudar os meus. As minhas causas. Eu quero prover uma vida maneira pra minha família. Eu quero tirar minha mãe do Brasil e botar ela mais confortável e mais segura em Portugal ou algum outro canto da Europa.
Eu quero ajudar as pessoas subrepresentadas das mentorias com as quais eu me envolvi.
Eu quero doar grana pras causas que me interessam.
Os pontos acima são autruístas só no sentido de querer ajudar alguém, mas são egoístas no sentido de que quero ajudar oque faz parte do meu mundo próximo. O capitalismo ofecere isso. Isso é bem compatível com como seres humanos pensam e agem. Não há como convencer gente o suficiente no mundo de não serem assim.
O lado de conveniencia e querer estar vivo num mundo que tem as coisas que me interessam (egoísmo puro).
Ao mesmo tempo que hollywood é uma máquina de espalhar a visão americana no mundo, e que empresas de videogames são corporações que exploram a paixão de seus funcionários, são sexistas e tóxicas, eu não queria estar vivo num mundo sem filmes e videogames (livros também).
Arte é corrompida pelo capitalismo, e acaba fazendo muitas dessas mídias serem manipulativas e reforçantes de esteriótipos derrogatórios, mas o capitalismo também viabiliza projetos que seriam impossíveis sem ele.
Pessoas podem argumentar que entretenimento é algo supérfulo, mas pra qualquer pessoa que esteja no meio ou no topo da cadeia de necessidades isso é muito importante.
Sobre o ponto de cima, não dá pra focar todos os esforços do mundo no que algumas pessoas bravejam como prioridade (que varia de pessoa pra pessoa). Whataboutism vai aparecer em todas essas discussões. "Tá, mas tu ta ajudando o Haiti, mas e as pessoas carentes da sua cidade?", "Tá, mas tu doou essa grana pra essa pessoa ali, e as ongs que eu postei semana passada?". Faz o teu, e segue jogo (Salvo que ainda dá pra criticar double standards, principalmente se for de governos, tipo a galera recebendo 2 milhoes de refugiados da Ucrânia em poucos dias, mas tendo altas "dificuldades" quando foi a Síria, e claramente foi racismo/xenofobia).
Videogame é o ápice do entretenimento pra mim. Terapia é óbviamente o mais importante pra minha saúde mental, mas videogames me ajudam muito a lidar com o mundo. Videogames foram o que me ensinaram inglês. Videogames foi onde tive meus primeiros contatos com estratégia. Videogames com mensagens boas foram muito importantes pra mim, por exemplo, pra ser mais consciente socialmente. Foi onde fiz diversos amigos, e onde mantenho amizades de anos. Videogame é uma coisa muito capitalista pra mim... Envolve muitas horas de esforço pra fazer, diversas disciplinas, diversos profissionais, e muita grana. Jogos indie nem tanto, o que é bacana também.
Um post sobre arte, mensagens em mídias em geral deve vir depois desse, é tangencial à essa discussão sobre capitalismo, mas não cabe aqui.
Existem outras coisas superfulas que são "produto do capitalismo" que outras pessoas iriam listar aqui. Acho que muitas iam ter a ver com alguma forma de arte. Algumas talvez fora de entretenimento, mas ainda adjacentes.
Conveniencia e conforto (para previlegiados do capitalismo). Automatizar tarefas, melhorar mobilidade, facilitar a vida. É dificil medir o valor que isso tem em detrimento do impacto no sistema, mas é algo que é difícil de abidicar. Não tenho o que argumentar aqui, e sou uma das pessoas que quer, de forma egoísta, vários desse confortos. Alguns, como poder fazer terapia em portugues com minha psicologa que ta no brasil, sem ter a barreira de linguagem na alemanha, não são só conforto, na verdade.
Um argumento recorrente é que nada disso é necessário, que é tudo superfulo, e que o ser humano consegue viver sem nada disso com facilidade. Mas ao mesmo tempo é defendido que o capitalismo é viciante, contagiante e meio "brainwashy". O ponto é que o efeito do capitalismo já foi feito. E achar que isso é superfulo pra literalmente todo mundo é muito não considerar situações individuais.
O lado de progresso tecnologico e de saúde
O maior benefício da pressão capitalista por crescimento talvez seja a de a gente ter muito mais progresso tecnológico e avançoes em ciência em geral.
Mas existe o argumento de que isso é só achar soluções para problemas que o próprio capitalismo cria. O que é verdade em várias instancias.
Minha visão é geralmente bem centrista em quase tudo, e aqui também é. Eu acho que o crescimento tecnológico desenfreado não é bom, e que os incentivos sempre são comrrompidos. Aqui eu acho que as prioridades são sim, de maneira geral, quase todas zuadas. Mas o argumento de que o avanço não é necessário por conta de só arrumar o que a gente mesmo está estragando não me engole bem.
Cancer é uma doença que sempre existiu. É pior agora, e talvez o capitalismo piore a sua ocorrencia/frequencia, mas é algo que sempre existiu. Sem avanços tecnológicos não teríamos nunca como combater o Cancer. Não dá pra saber o quão infrequente o Cancer seria sem o capitalismo, e qualquer coisa que venha é especulação. E lembrando: O capitalismo não vai acabar. Não adianta demonizar e criticar algo dessa forma. Não dá pra ser otimista e pessimista ao mesmo tempo desse tanto em duas coisas, só por que validam seu viés de confirmação: Ser otimista em exagero com, por exemplo, derrubar/mudar o capitalismo, e ser pessimista em exagero com todos os efeitos do capitalismo.
Energia verde sustentável só foi possível por avanços tecnológicos.
Pessoas que tem alguma deficiencia física, e com avanços da tecnologia, tem como ter uma vida mais confortável, ou, em alguns casos, passam a poder de fato viver.
A busca da verdade. Avanços em ciências que não tem relação óbvia com algo que melhora nossa vida, mas é importante mesmo assim. Avanços em matemática, física, e outras ciências puras. Acho que cai naquilo que eu falei antes. Avanços que melhoram a vida de um jeito sistêmico, que não é óbvio e bem complexo. É difícil priorizar esforços, quando não sabemos o que vai nos ajudar. Faz o teu. Sem matemática, estastística, física, tecnologia, ou sem avanços em geral a gente não teria como monitorar os efeitos que a gente causa no mundo, pro exemplo. Ou mesmo pensando em um mundo "sem capitalismo", se tivesse algum desastre natural inevitável, não teríamos como nos proteger se não tivéssemos tido avanços o suficiente. Defender que isso é bom (não ter tido os avanços) vai ser algo que não dá pra discutir, vai ser agree to disagree.
Discurso e audiencia
- Aqui vai ter só um item. Se você tem um discurso que tem a intencao de mudar pessoas, ou de ter um impacto maior do que só pessoas ouvindo, você precisa falar com pessoas que não concordam contigo. Se você está falando a mesma coisa, sempre, de maneira que soa completamente divergente das pessoas que não concordam contigo, e todo mundo que te escuta já concorda contigo, parabéns, você não tá fazendo nada.
O que eu quero fazer, e o que eu acho que seria bacana acontecer mais
Eu quero boicotar, na medida do possível, empresas que são grandes demais e detrimentais para um sistema sustentável. Eu trabalho com tech, nem sempre vai ser possível. Mas vou fazer o que eu puder.
Eu quero parar de comprar por delivery toda semana, que nem fazia antes. Talvez tentar cortar de vez eventualmente.
Eu quero icentivar empresas que tem algum impacto positivo, B-Corps, Cooperativas e tals. Tomorrow Bank (ainda é um banco...), Ecosia, Kiron e similares.
Em meus projetos pessoais tentar usar menos big techs. Usar minha própria infra ou alternativas verdes de provedores menores.
Ser mais atento ao meu consumismo, e focar em coisas que gosto muito ou que são prioridades.
Participar de mais iniciativas de impacto social positivo. Mentorias como a EducaTransforma, ou a collective que estou levantando com meu amigo Jojo, a uncloud.do.
Tentar tirar essa aversão com tudo que seja anti-capitalista na minha família e bolha. É uma aversão que eu tinha, mas eu acho que essas iniciativas podem ser pelo menos na vibe que descrevi aqui. Coexistentes com o capitalismo (talvez seja a maior birra do lado deles).
Tentar participar mais de iniciativas de Open Source com viés de privacidade, ativismo e cunho social.
Coisas que vou continuar fazendo alimentando o capitalismo e meu egoísmo individual
Vou continuar consumindo conteúdo Hollywoodiano que gosto. Evitando dar muita grana pra Amazon ou outras gigantes.
Vou continuar voando de aviões em algumas viagens que são chave pra mim, liberando mais CO2 que devia. Tanto pra visitar minha família, quanto pra visitar o mundo. Ainda vou tentar evitar Aviões quando não for necessário, como fiz pra ir pra Amsterdam e Londres recentemente.
Vou continuar consumindo conteúdo de games que me apetecerem. Videogame é um treco que não estou disposto a largar. Não vou comprar franquias gigantes que não entregarem exatamente o que quero jogar. Já comprei muito jogo em bundles e por hype, e isso quero evitar fazer seguindo em diante.
Vou trabalhar pra empresas grandes em tech, se elas tiverem grandes iniciativas Open Source. É o que consigo fazer, até que eu tenha algo meu, ou faça freelance.
Talvez eu abra uma empresa. Talvez eu me odeie se tiver que procurar investimento e não conseguir tocar tudo com self funding. Mas isso é problema do Lucas do futuro.
Talvez eu compre uma casa pra minha mãe.
Deve ter mais coisa.
Dito isso
Eu ainda acho que pessoas que são um pouco mais indignadas e críticas são necessárias. Elas vão puxar o pendulo um pouco mais pro lado delas, pelo menos de pessoas que já estão inclinadas a isso.
Pessoas "baby-steps" mudaram como penso. Pessoas um pouco mais extremas mudaram como ajo. Pessoas com ideias mais utópicas, mas com ações mais "baby-steps" são as de maior impacto.
Eu admiro e acho mais do que válido pessoas que são mais comprometidas com mudanças drásticas. Nunca mais voar de avião. Vegano total. Não consome produtos que tem processo de produção e transporte inconscequente. Nunca pede delivery. E tudo mais. Não dá pra esperar, ainda, que uma grande parte da população faça isso (e nem queira fazer isso).
Eu não sou anti-capitalista. No sentido de que eu não quero que o capitalismo acabe (e não acho que seja possível). Mas sou anti-capitalista no sentido de achar que a gente tem que tentar ser menos capitalista, o máximo possível que conseguirmos. E não invalidar esforços dos que estão tentando (e fazendo menos) só por conta da urgencia que é colocada nos problemas que vem do capitalismo.
Eu sofro de ansiedade e enxaquecas que muitas vezes estão relacionadas, dentre outras coisas. Eu só consigo ajudar o próximo depois que eu consigo me ajudar. Entretenimento, conveniencia, conforto, suporte está totalmente diretamente relacionado ao tanto que eu consigo ajudar pessoas que precisam e querem minha ajuda, ou as pessoas que são impactadas pelas ações das iniciativas que participo. É uma escolha consciente que eu acho que faz sentido.
Lá em cima falei que o capitalismo não vai acabar, e é só uma forma pessimista de olhar pra isso. Mas olhando pras previsões apocalípticas que temos para nosso mundo, a gente acaba antes do capitalismo anyways, mesmo se ele fosse acabar. Bota aí mais 7 mil anos (sei la) pra algo surgir com avanços necessários para algo ser "mais atrativo" e "contagiante" que o capitalismo, e a gente não tem todo esse tempo.